Hoje eu sou alta, mas não muito, o suficiente para ser notada e não necessitar dos saltos altos. Cabelos longos, finos, liso na raiz e um pouco ondulado nas pontas, de um tom puxado para ruivo, mais perto do cobre. Meus olhos, no processo, digamos que deu um certo erro, não que tenha danificado algo, apenas único, talvez especial. Eles são verdes, mas não completamente, no interior, a cor mel prevalece, dando um toque de exclusividade.
Sou branca, completamente pálida. Rosto, braços, pernas e barriga, tudo. E não é por falta de tentar, até procuro passear um pouco no sol, mas bronzeada é algo que não costumo ficar. Passo protetor solar, para me proteger do exagero, mas sempre fico bastante vermelha. Fico parecendo um bombom de chocolate branco com morango, simples assim.
O dia amanheceu com uma brisa agradável, uma temperatura gostosa. Um sol ralo, com pequena intensidade. Felizmente não tenho aula, por motivos de que meu professor está doente, e hoje só teria aula com ele. Minha programação até 1 hora atrás estava completamente vazia, meus horários todos vagos. Mas minha amiga me ligou e pediu ajuda para fazer uns bolos para enviar à uma instituição de crianças órfãs, que ela é voluntária.
Esta amiga, é bastante atrapalhada, mas sempre com muita boa vontade para ajudar quem precisa. Cozinha muito bem, seus doces e salgados são de dar água na boca, só de ver eles serem feitos. Por sorte ela mora em uma casa grande, em uma bairro luxuoso, com empregados 24 horas, porque com toda a bagunça que ela faz na cozinha, precisaria de um belo time, para reorganizar o lugar.
Ao chegar na mansão, fui recebida calorosamente pelos empregados e por uma névoa de farinha. Caos, é uma boa palavra para descrever o lugar, as duas longas bancadas que se localizam no meio da cozinha, estão cheias e um pouco sujas. Dois pacotes de bolos prontos e já embrulhados, um de chocolate e outro que parece de cenoura. Ao lado, mais quatro formas vazias mas já untadas, esperando para colocar a massa. Ao redor das formas, diversas colheres, potes e ingredientes, todos desorganizados e espalhados pelas bancadas.
Com os morenos cachos presos em um alto coque, minha amiga se encontra em frente ao forno, segurando um pote com a mão esquerda e com a direita uma colher de pau, com a qual está batendo a massa com destreza, em movimentos muito rápido. Em um instante de descanso, ela nota a minha presença e abre um radiante sorriso, repousa a bacia em cima do forno e faz gestos de felicidade e me situa do andamento da produção dos bolos.
Eu disse hoje, porque ontem, ahh ontem conheci pessoas inimagináveis, fiz coisas que nunca, em plena sobriedade faria. Ontem eu era loira, com uma franja recente, caída nos olhos, mas que facilmente dava para organiza-la atrás de minhas orelhas. Meus cílios eram longos, moreno claro, quase loiro, precisei passar um rímel para deixa-los visíveis e ressaltar meus olhos verdes.
Com o clima agradável que estava, céu azul, com poucas nuvens, um sol bonito e tranquilo, pude usar a saia que ganhei. Foi um presente inesperado, de uma pessoa inesperada, mas de muito bom gosto. Curta, mas nada escandaloso que mostre meu útero, comportada. De cor laranja vivo, mas ao mesmo tempo discreta. A saia era soltinha, de algodão, muito confortável. Junto, coloquei uma regata branca, simples.
Saí de casa desacompanhada, sem compromisso. Com uma bolsa pequena, cruzada, que continha apenas o necessário, documento, dinheiro, chave de casa, celular e os óculos escuros. Dessa vez, pela primeira vez, resolvi passear ouvindo o som do ambiente, natural, os batuques distraídos, o chacoalhar das pernas das pessoas imperativas, os assobios dos pássaros, o barulho dos pneus contra o asfalto, que as vezes, deixava até marcas.
Reparei em uma esquina, que de longe parecia uma qualquer em meio de tantas, mas ao chegar perto, ouvi o burburinho das risadas, da conversa que abraçava a alma, do som baixo e sorrateiro de um jazz antigo, que fazia sintonia à conversa. Havia umas dez pessoas, um grupo pequeno que apreciava e participava de uma arte conjunta em uma parede, que um dia foi branca, mas que naquele momento, estava sendo decorada por várias mãos, discutida por diversas mentes e apreciada por muitos olhares. Todas as cores, encobria aquele muro, formas desenvolvidas, específicas para aquela arte, traços delicados um após o outro.
Atravessei a rua, com um cuidado distraído, cheguei perto sem fazer muito alvoroço. Esperei o momento certo, quando as risadas diminuíram o volume e juntos, em plena sincronia fizeram uma pausa para respirar. Comentei, em um tom sincero e de fato surpreso, o quão lindo tudo aquilo estava se tornando, perguntei se eu poderia entrar no ambiente tão animado e contagiante. O grupo me abraçou com os olhos, cada um demonstrou tamanha simpatia, e com gestos me convidaram para fazer parte daquele círculo artístico. Me ofereceram algo para beber e após poucos minutos, me senti rodeada de novos amigos, com novas ideias.
Aquela manhã tranquila, se tornou um uma tarde maravilhosa. Quando reparei, o céu estava tingido em um tom rosado, mesclando o laranja ao rosa, era como se a natureza estivesse fazendo parte daquela arte, que se prolongou durante o dia todo. Com a descida do sol, uma brisa fresca envolveu meus cabelos e das mulheres ao meu redor. Todos, se estremeceram com a chegada do vento frio.
Com os copos cheios e as geladeiras portáveis, a reunião se trans-locomoveu para a casa de uma das mulheres. Esta, aparentava uns 23 anos, jovem, de pele bronzeada, cabelos morenos e cacheados, em seu braço esquerdo havia uma tatuagem bastante detalhada, que diante os desenhos feito por ela no muro, acredito que ela mesmo, tenha feito o rascunho. Vestia um calça jeans com diversos rasgos transversais ao longo das pernas, nada muito destroçado, junto, vestia uma camiseta de cor vinho, com um considerável decote em que seu médio busto se portava muito bem nele. Ela acolheu todos com muito bom grado em seu apartamento, que na verdade parecia mais um loft. As bebidas alcoólicas se prolongaram durante toda a noite, e o jazz sorrateiro da tarde, se transformou em músicas eletrônicas, que invadiu o ambiente e fez cada batida dos corações presentes no espaço, batessem mais rápido e o que fez parte da música, de corpo e alma.
15.10.14 - 16.10.14